terça-feira, 6 de março de 2018

O primeiro amor a gente nunca esquece


Há alguns meses atrás, eu estava num supermercado e quase esbarrei numa garota sorridente, alegre, simpática, linda, baixinha e com um corpo escultural. Por coincidência, ficamos no mesmo caixa e ela era só sorrisos e simpatia enquanto conversava com uma amiga que a acompanhava. A guria era tão simpática, que a sua alegria de viver transbordava, contagiando todo mundo ao seu redor. Na hora eu até pensei que se eu não fosse um balzaquiano e ela não aparentasse ter menos de dezoito anos, dava até para tentar uma aproximação despretensiosa. Mas enfim, ela foi-se e eu me recordei que, há algum tempo atrás, havia conhecido também outra mulher bastante deslumbrante. Ela era uma amiga de minha prima que fazia medicina e era, sem exageros, uma das mais fantásticas mulheres que já conheci. A graduanda em medicina, além de ser linda de morrer, era simpática, alegre, charmosa, solidária, amante da natureza e, quem diria, bastante politizada. Essa futura médica está noiva já há algum tempo e não deve demorar para se casar. Diante desses dois exemplos mais recentes, parece que o meu celibato voluntário e a minha imunidade à paixão tiveram um leve abalo diante dessas duas beldades, mas logo eu consegui me recompor. Porém, antes de pegar ojeriza por relacionamentos e antes de me tornar uma espécie de monge herege, lembrei-me dos tempos em que eu era feliz e não sabia. Lembrei-me do primeiro amor que vivi quando ainda era criança.

Foi assim, como ver o mar...

Para muitas crianças, o primeiro amor está em algum objeto inanimado, como um brinquedo ou algum jogo. Há também aquelas crianças que encontram seu primeiro amor em algum bichinho de estimação, como foi o caso do porquinho-da-índia de Manuel Bandeira. Outras se apaixonam por pessoas: seja pela professora, seja pela atriz da novela ou até por personagens de desenhos. Mas o meu primeiro amor não foi nem um brinquedo, nem um bicho de estimação e nem mulheres inacessíveis. O meu primeiro amor foi uma menina que conheci numa casa de veraneio no litoral norte pernambucano quando devia ter entre 6 e 8 anos. E relembrando de tudo aquilo que vivi na época, cheguei a uma conclusão interessante.



Eu conheci essa menina na praia, enquanto construia um castelo de areia sob o sol morno de uma manhã ensolarada qualquer de carnaval. Ela estava passando, parou para olhar a minha escultura, achou bacana e resolveu construir um castelo também do lado do meu. A garota disse o nome dela, que eu não lembro mais qual era, a idade (era um ou dois anos mais velha que eu), onde morava e, para minha surpresa, descobri que ela era a nossa vizinha na casa de veraneio. Assim como eu, ela estava passado o carnaval numa casa alugada junto com a família e isso acabou, de certa forma, nos aproximando. Lembro que a mãe dela a levava para a praia todas as manhãs e a gente ficava lá, conversando, fazendo castelos, jogando bola, mergulhando no mar. Eu lembro que a achava muito simpática e divertida, e quase sem perceber, comecei a sentir uma coisa meia estranha por ela, uma afinidade esquisita que parecia ser mais forte que a amizade. A gente chegou a andar de mãos dadas, a dar uns beijinhos no rosto (tudo com os pais da gente por perto) e a trocar segredos. Tudo de maneira bem inocente, bem pueril, bem natural. Quando a semana de carnaval acabou, chegou a hora de deixar a praia e voltarmos para casa. Era a hora da despedida. Mas, sei lá o que deu em mim, tive um ataque de timidez muito grande e não consegui ir na casa dela me despedir na frente da família dela inteira. O meu tio até me incentivou com uma frase que lembro até hoje: "Vai lá se despedir da tua namorada, rapaz." Enfim, a gente só deu um tchauzinho de longe um para o outro e nunca mais nos vimos novamente.


Depois da despedida, fiquei com uma pulga atrás da orelha, porque eu nunca me dei conta de que estávamos tendo algo além da amizade. Era tudo tão novo, tão diferente, tão agradável. Eu me perguntei várias vezes se realmente estávamos "namorando" ou se éramos apenas "bons amigos". Na época, eu nem sabia direito o que era namorar e nem sabia exatamente o que tinha ocorrido. Só sei que eu senti uma saudade gigantesca daquela menina depois que voltei para casa. Pensava nela, nas nossas brincadeiras, nos beijinhos na bochecha... Até perguntei para minha mãe se ela tinha o telefone da menina e a resposta foi: "Não. Por que não pediu o telefone a ela?" Foi aí que eu percebi que eu realmente gostava daquela menina. O que vivi, apesar de ter sido puro, fugaz e inocente, foi algo mágico e inesquecível. Alguns anos depois, sabendo mais ou menos do que se tratava, cheguei à conclusão de que aquela guria que tinha sido uma espécie de "amiga colorida". E assim acreditei ter sido durante boa parte de minha vida.



Hoje, olhando para trás e recordando de tudo que vi e vivi, cheguei à conclusão que aquela menina que nem lembro mais o nome foi mais que uma amiga, foi mais que uma ficante: ela foi o meu primeiro amor. Ela foi a minha primeira namoradinha. O cuidado, o carinho e o apego que tínhamos um pelo outro foi algo que me marcou para a vida toda. Sempre que eu me recordo disso, fico com um sorriso bobo, feliz e satisfeito por lembrar do tempo que descobri o amor sem perceber.


Atualmente, eu já não vejo mais graça em relacionamentos, porque sinto que já vi e vivi tudo que tinha para se viver neste sentido. Não há mais nada de novo, não há mais nada de intenso: não há mais nada para se aproveitar ou se descobrir em um namoro ou relacionamento. Nem mesmo a paixão faz mais sentido para mim, porque é um sentimento passageiro que acaba se tornando autodestrutivo. Sinto que tudo seria totalmente falso, repetitivo e forçado se eu tentasse me relacionar atualmente. Hoje, eu aprecio a solidão. Encontrei a paz interior e a capacidade de ser plenamente feliz sem a companhia de ninguém. Mas as memórias boas das antigas descobertas sempre acompanhar-me-ão, porque naquela época, sim, elas valeram a pena serem vividas. Pois como dizia o poeta Drummond em seu poema enloucrescer: "Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário para fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido."

Enloucresça!

Namastê!

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